#14 Shibari Sounds
- Roberta Fauth
- 13 de jan.
- 5 min de leitura
Atualizado: 14 de jan.

Essa história ficará ainda mais evolvnte se for lida ao som dessa música aqui: https://open.spotify.com/intl-pt/track/6LD3no7MTmPoyFoBh4UNDX?si=f6e1256c2e8f484a
Foi um dia quente. O final da tarde vinha igualmente quente, dessas tardes que fazem a pele destilar pedindo por toques firmes e macios e a mente embarcar em devaneios. Havíamos conversado semanas sobre essa experiência – um acordo firmado entre olhares intensos e o calor do que poderia ser. Sim, ele tem naturalmente aquele frescor de quem quer tudo ao mesmo tempo, com uma entrega curiosa, quase reverente. E ainda assim ele é uma pessoa intrigante: apesar da pouca idade, é bastante maduro, um cavalheiro perfeito. Não, pera... ele é moleque também, mas só quando convém. Está desenvolvendo a capacidade de separar as emoções dos sentimentos, classificar suas relações de uma forma que faz sentido na sua cabeça, respeita os sentimentos de quem se abre pra ele. Ao passo que é absolutamente intenso nas interações, ele não entrega o jogo fácil. Acontece que entre nós tem uma transmissão mente-a-mente, e eu sei perfeitamente que eu entro nas profundezas dele ignorando se há cadeado nas portas, trago pra superfície todo desejo de sentir e de experimentar o amor de um jeito que ele jamais vai ter de outra pessoa. Possivelmente ele proporcione isso a alguém no futuro, e se isso acontecer, ainda assim, eu estarei presente na superfície e no calor da pele gostosa que ele tem.
Enquanto eu tomava banho, pensava em cada detalhe do que eu gostaria de propor logo mais. Fui até a casa dele, com alguns contratempos, meio que trabalhando do uber. Esses contratempos me bagunçam um pouco, mas eu decidi que nada ia atrapalhar a minha concentração e presença. No final, fui recebida muito bem, e é incrível como a gente tem assunto. Quando eu me mexi pra gente começar a brincar, fui ver o espaço. No quarto, ele tem uma chaise long que estava pronta para ser palco. Ele deixou a luz vermelha, eu escolhi uma playlist a dedo – sons envolventes, ritmos que embalassem o momento como uma correnteza morna, mas forte. Separei as cordas, testei as texturas entre os dedos, sentindo o contraste entre o macio do algodão e a aspereza da juta. No fundo, uma leve ansiedade me acompanhava, mas não era desconforto; era o tremor de quem está prestes a atravessar um portal. Ele é Switcher, mas predominantemente Dom. Nesse dia, ele estava disposto a me ceder o controle, o poder, se colocar em um estado de vulnerabilidade e entrega pra experimentarmos sensações diferentes. Eu entendo o tamanho do privilégio que eu tenho, porque não mantemos uma relação D/S verticalizada. E eu também consigo compreender que, sempre que ele exerce o poder sobre mim, é só porque EU QUERO. E isso faz toda a diferença nessa interação.
Eu o trouxe pela mão, conversamos sobre os limites, sobre a confiança. “Confio em você”, ele disse, e o peso dessas palavras aterrissou com suavidade no meu peito. Ele ficou sentado na chaise, eu sentei atrás dele, estava sem camisa, a pele quente e os olhos fechados. Apesar de ele estar assim "olhando pra dentro", eu quis vendar seus olhos, percebendo como sua respiração mudava ao perder o controle da visão. Percorri com as mãos e depois com as cordas o seu corpo, queria que ele sentisse a textura da juta. Ele veio pro jogo querendo se entregar, e isso era tão bonito quanto desconcertante, porque era perfeitamente visível. As cordas deslizaram pela coxa, tocaram o peito dele como uma segunda pele. Cada volta, cada nó era uma comunicação silenciosa, um código que fomos construindo e só nós dois somos capazer de compreender. Ele reagia com pequenos movimentos, às vezes com gemidos, mas permaneceu não verbal o tempo todo. Eu interpretei cada reação como se ele estivesse testando os seus próprios limites e se deleitando com cada decisão de aceitá-los. A chaise long sustentava seu corpo como uma moldura sustenta uma obra de arte.
Quando eu fiquei satisfeita com a amarração, peguei os objetos que tinha separado: um pincel fino que fazia cócegas, uma canetinha de tinta lavável para desenhar mapas na pele dele, coisas com texturas macias e outras ásperas que provocavam arrepios contrastantes. Cada toque era uma nota nessa música improvisada. Ele gemia baixinho, a respiração se alterava e depois voltava ao ritmo lento - ele estava navegando entre ondas de sensações. Estimulei os sentidos dele com um óleo perfumado - o meu perfume. E com isso eu senti que demarquei o meu território no seu corpo. Tudo obedeceu a um ritmo lento. Quando eu estava pronta pra desamarrar, vesti uma meia-calça pra que ele pudesse sentir a textura - que ele ama. Os kinks dele não são difíceis de satisfazer e me permitem uma sensação de poder que, apesar de não estarem no espectro da minha preferência, são deliciosos. Ele me dá essa sensação de maneira absurdamente despretenciosa. Passei o tecido fino pelas suas pernas, pelo pescoço, pelo rosto, e deixei que ele sentisse cada centímetro daquele contato. E teve um impacto lindo de observar. Ele ensaiava algum movimento, e não era para fugir, mas para mergulhar mais fundo. E eu, do alto do meu domspace*, ao ver as suas reações, deixei que isso me atingisse como um murro. Porque reverberava muito forte no meu corpo. Senti um poder que não vinha de dominar, mas de criar um espaço lúdico e seguro para ele se perder. E me deixei mergulhar junto com ele nesse lugar.
Quando o desamarrei, esperava uma explosão. Ele estava duro e excitado, eu tinha um mar no meu corpo e imaginei que ele viria para cima de mim com a fúria de uma besta faminta e urgente. Mas ele me surpreendeu. Seu olhar, agora desvendado, era terno, agradecido. O aftercare teve amorzinho gostoso, conchinha e um puxão de leve para perto. Era o desejo dele, não quis que eu fosse embora, me pediu pra ficar e dormir. E assim foi. Nessa noite não teve sexo como a gente faz. Fizemos amor devagar, sem pressa, como se cada toque carregasse a eternidade de um gesto. O contraste entre a intensidade do que havia acabado de acontecer e a suavidade daquele momento me desarmou de um jeito que eu não estava esperando. A sensação era de termos explorado uma galáxia juntos e agora estivéssemos prontos para descansar sob suas estrelas. Eu atravessei o portal que vi bem na minha frente quando cheguei na casa dele. E por me conhecer tanto, eu sei que isso ainda vai me dar material pra pensar e digerir. Todas as minhas ações naquela noite, mesmo as mais contidas, estavam envolvidas em uma bruma de pensamentos que precisavam ser decodificados.
Eu adormeci ouvindo a respiração dele, sentindo a realidade de um instante que parecia tão onírico quanto palpável. A vida tem dessas: quando você acha que sabe o que vem a seguir, ela troca as cartas e te presenteia com algo ainda melhor. Eu sinto que tenho muito material da troca e da conexão que nós construímos para formar crônicas envolventes, e sinto necessidade de deixar que isso escorra pelos meus dedos em formato de texto, mas é necessário deixar registrado que qualquer elemento que eu possa trazer pra delinear os contornos do perfil desse cara será tão limitado e incapaz de defini-lo... Ele é um universo pra mim. Posso compartilhar que eu encontrei alguém muito raro e que eu quero permitir que fique, que explore, que se expanda e se contraia ao sabor de tudo que o atravessa.
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*domspace ou subspace são "lugares" ou estados alterados de consciência de quem domina e quem é dominado. Bastante comum durante as sessões de práticas BDSM, porque as pessoas se entregam às sensações produzidas e recebidas de um para o outro.
Eu sou Lilith Sem Roteiros e vou compartilhar com vocês as minhas experiências, reflexões, encontros e descobertas nas minhas aventuras amorosas fluidas.



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