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#8 Dominar, de Leve

  • Foto do escritor: Roberta Fauth
    Roberta Fauth
  • 15 de nov. de 2024
  • 6 min de leitura

Atualizado: 24 de mar.



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Essa história ficará ainda mais envolvente se você ler ao som desta música aqui: https://open.spotify.com/intl-pt/track/0j22qHa0UFrzpAZnQ40XO9?si=f761d97f2ba24667



O que é a juventude senão um fenômeno com hálito de inconstância, tão cheio de promessas e desmentidos? Recentemente, eu conheci um cara que me prometeu muito mais do que entregou. Isso não quer dizer, contudo, que a experiência com ele foi ruim (muito pelo contrário). Ele se identifica e acha que manifesta características dominantes. Numa primeira interação, ele passa essa imagem. Esse garoto fica irritado se chamado de garoto. De fato, a imagem não condiz com a conotação pejorativa da palavra quando eu a uso pra ele. É um homem, e não há dúvida que já passou da fase de bobagens imaturas e comportamentos fúteis. Nos encontramos numa noite de sexta-feira. A ideia era confirmar que tínhamos muito assunto aleatório, uma boa química e uma pessoa que amarra. Há uns tempos venho estudando shibari*, e só pratico self ties*. Acontece que estar contida nas cordas me proporciona uma sensação de profundo relaxamento. Então podemos dizer que eu estou atrás de um rigger* e esse cara tinha um ar promissor.


Como eu sempre digo, aqui pode tudo, só não pode qualquer coisa. Portanto, não é qualquer pessoa que vai chegar no meu universo e já usar as minhas cordas. Ele sabe o básico. Nó de algema, uma coluna, duas colunas. Beleza. Com isso podemos fazer várias coisas dentro e fora do contexto sexual. A nossa sexta-feira teve conversa, teve química, muito beijo na boca e demonstrações da força própria de um garoto que se olha no espelho e enxerga o homem que é.


Eu gosto muito dessa abordagem que tem conversas online que servem sim pra sentir se vale o tempo de um encontro e depois esse encontro, para confirmar as sensações iniciais e então alinhar as expectativas, especialmente se eu estiver em um contexto de BDSM. Pela minha experiência, todos os caras que tiveram esse tipo de abordagem comigo estão no topo da minha preferência. A emoção é jovem, senhoras e senhores; e não estou aqui me referindo aos números que contamos ao longo dos anos: estou falando do frescor das ideias, a abertura à imprevisibilidade, a confiança inabalável de que o futuro ainda está por se desenhar. Quando nos encontramos novamente, dias depois, viemos para a minha casa e ele trouxe tudo isso, adicionado a uma dose generosa de energia, potência e gentileza.


Nessa altura, eu já estava animadíssima achando que seria compelida a estender as mãos, passar alguns minutos - ou horas (por que não?) - contida e confortável numa amarração diferente do que eu estou acostumada. Só que isso não aconteceu. Eu estava tão encantada pelas provocações que eu fazia pra ele, considerando as tais características dominantes, e deixei passar que no fundo, ele é só um cara baunilha* que gosta de provocações. Quando eu percebi que eu não teria nada dentro do contexto que estava esperando, imediatamente olhei no fundo dos seus olhos e disse: "Você não é um dominador". "Você pode manifestar características dominantes, mas não é um dominador". Ele franziu a testa, descompensado, mas eu não deixei a frustração se instalar: "você se sente seguro pra confiar em mim? Posso te mostrar um pouco sobre o que eu chamo de dominação maleável?" E então eu vi o rosto desse garoto se iluminar de curiosidade e um pouquinho de medo. Mas ele, como o homem que se percebe, engoliu a insegurança e disse "sim".


Rapidamente introduzi a ele o conceito de São, Seguro e Consensual (SSC). Dei a ele duas palavras: uma para reduzir o ritmo, outra para parar imediatamente. Dei a ele detalhes do que eu pretendia fazer com ele daquele momento em diante. Ele sorria e dizia "sim", enquanto isso, já era possível perceber o volume se formando sob as suas calças. Depois dei a ele instruções claras sobre como ele deveria se comportar na minha presença. E dei a ele a lista das punições às quais estaria sujeito se ousasse me desagradar. Sorrindo, tenso e excitado, ele dizia "sim". Então ordenei que ele tirasse toda a roupa devagar, sem me olhar diretamente nos olhos e se sentasse confortável no sofá, lindo, adornando a minha sala. Sorrindo, assim ele fez. Como ele conhece os nós básicos e topou a experiência, usei no início, duas cordas, uma para cada pé, e fiz uma coluna em cada tornozelo. Amarrei a outra extremidade dessas cordas nos pés do sofá, de maneira que ele não podia mais fechar as pernas. Ordenei que ele estendesse as mãos, e uma dupla coluna fechou a algema que levou os braços para trás da cabeça, finalizando no peito, apenas para permanecer contido enquanto durasse a minha brincadeira.


Então comecei a dar a ele tudo isso de que ele gosta: provocação. SÓ provocação. MUITA provocação. Com as mãos, com a boca, com água gelada em estado líquido e com pedrinhas de gelo, um som gostoso e relaxante. Ele entrava em transe por instantes e depois ficava muito agitado. Eu não permitia que ele fechasse os olhos ou tirasse os olhos dos meus. Se relaxado demais, recebia um estalo de um flogger na coxa. Então ele se mostrava muito presente. Ficamos brincando por quase uma hora dessa forma. Eu o levei a um lugar de excitação máxima, interrompendo os estímulos repentinamente quando a respiração dele se alterava muito, ou quando ele manifestava o desejo de me penetrar ou de gozar. Ele não queria que parasse, e as minhas ações provocadoras eram nada menos do que recompensas por ele estar excitado, presente, dócil, e devotado à sua rainha/deusa/fada e vários outros adjetivos não sexuais que ele precisou criar pra me deixar feliz e satisfeita. Enquanto eu estivesse feliz e satisfeita, ele teria as suas recompensas. Ele dizia toda sorte de coisas deliciosas sobre o que estava sentindo, e isso reverberava no meu corpo com desejo e umas mordidas ardidas. Ele reclamava das mordidas. Reclamava do flogger também. E mesmo assim não foi por isso que ele pediu clemência.


Quando eu ouvi "clemência", ele estava pedindo pra que eu desamarrasse as mãos e permitisse que ele explorasse o meu corpo "só um pouquinho", com a voz rouca e cara de gato manso. É incontestável que ele suportou no mínimo 40 longos minutos amarrado e recebendo todo tipo de provocação que a minha imaginação permitiu. Ele mereceu ter as mãos libertas e o meu corpo agradeceu a voracidade com que ele me segurou, ignorando completamente que isso não estava na lista de permissões que eu dei a ele no começo. Por essa ousadia, ele apanhou de novo, e eu recebi a palavra que encerra o jogo. Agora, completamente liberto, ele também estava livre para tirar o que ainda restava da minha roupa, e tivemos muitas horas de prazer e descobertas naquela noite.


Não é que ele seja submisso. Ele simplesmente não faz parte desse mundo. Foi interessante essa experiência, porque pra ambos, a sensação era como se aquele momento convidasse a redescobrir o sentido da leveza, do corpo e da mente, sem os pesos das convenções sociais, que ditam o que é esperado de uma relação entre homem e mulher. Foi sim, um jogo bastante leve, muito mais de agrado do que de punição. O poder ali, no fim, estava bastante distribuído, pois ele entendeu que deveria entrar no personagem e me adorar como a uma divindade. E ele foi perfeito nesse papel. Deixei que levasse o flogger como uma lembrança carinhosa. Achei bonitinho que ele pediu, muito reverente, que eu desse a ele esse presente. Tivemos uma troca genuína, e isso eu atribuo à sua pouca idade. Os homens mais jovens são sim mais dispostos a aceitar a incerteza como parte do processo de viver. E talvez, no fundo, seja essa disposição para o risco, esse abrir de portas que podem levar a qualquer lugar, o que mais me atrai neles. Eu gosto dessa troca assimétrica, dessa maneira de compartilhar, sem pressa de ter respostas. Meu corpo, meu intelecto, minhas palavras – tudo isso se tornam um campo fértil onde posso semear novas ideias, novas possibilidades. E a história inesquecível que eu dei de presente pra esse garoto ainda vai se repetir, se reinventar e aprimorar.


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*Shibari. É uma técnica milenar japonesa que utiliza amarrações em corda para estimular o prazer entre parceiros. Pode ser usado em contexto sexual ou não.

*Self Ties. Auto amarração no contexto do Shibari.

*Rigger. É a pessoa que realiza a amarra.

*Baunilha. As pessoas que não se relacionam dentro de um contexto BDSM


Eu sou Lilith Sem Roteiros e vou compartilhar com vocês as minhas experiências, reflexões, encontros e descobertas nas minhas aventuras amorosas fluidas.

 
 
 

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